Sam Darcy¹ – Como funcionava a democracia soviética nos anos 30²

Fonte: Para a História do Socialismo (www.hist-socialismo.net)

Tradução do inglês (cotejado com a versão francesa) e edição por CN em 30/04/2012 (http://www.revolutionarydemocracy.org/rdv11n2/darcy.htm)


(…) Em Dezembro de 1936, o Partido Comunista devia realizar as eleições anuais dos seus dirigentes. Até ali, as candidaturas e eleições para cargos partidários tinham sido sempre feitas abertamente. Mas devido a esta prática havia membros que se sentiam muitas vezes constrangidos em expressar a sua oposição a certas figuras poderosas dos comitês executivos, com receio de represálias. O Comitê Central decidiu então submeter toda a direção a um teste para saber se os seus membros tinham realmente a aceitação das bases. Aqueles que realizavam um serviço público útil seriam provavelmente reeleitos, enquanto outros, que estavam simplesmente agarrados a uma sinecura e a um lugar de poder, dificilmente manteriam os seus cargos. Com este fim foi introduzido o voto secreto.

Continuar lendo

Em defesa do martelo e da foice: sobre simbolismo e luta

Por Charles Wofford

De acordo com a Teoria da Hegemonia Cultural, frequentemente atribuída a Antonio Gramsci, mas também desenvolvida por Edward Said e Nicos Poulantzas entre outros, a classe dominante mantém seu poder moldando deliberadamente o discurso cultural ao qual a população está exposta. Os teóricos da hegemonia reconheceram que nenhuma classe dominante pode sobreviver pela aplicação constante de violência; deve obter algum grau de legitimidade entre a população oprimida. Isso significa normalizar o status quo opressor. A hegemonia cultural é, portanto, a estrutura pela qual o governante mantém a dominação cotidiana, e pode ser vista como o complemento da aplicação deliberada da violência, que é reservada para aqueles momentos em que a hegemonia não consegue marginalizar a população.

Uma parte importante da manutenção da hegemonia cultural é controlar a linguagem. No discurso político estadunidense, aquele movimento cujas políticas podem destruir o mundo é referido como “conservadorismo”; o partido que zomba abertamente dos processos democráticos é o Partido “Democrático”; aqueles que defendem uma total tirania das corporações privadas se autodenominam “libertários”; e defender o aumento do número de proprietários de bancos privados (“desmembrar os bancos!”), em vez de defender o controle socializado dos bancos, é o suficiente para merecer o título de “socialista”. Esse tipo de distorção (ou adequação ao politicamente correto) é como o rastro da hegemonia cultural.

Um aspecto diferente do controle da linguagem é o controle dos símbolos. Dado o esforço da esquerda em direção à democracia popular (ou, como podemos chamá-la, “democracia”), quais são as distorções hegemônicas dos símbolos da democracia? E o padrão de transformar os termos em seus opostos (como exemplificado acima) nos dá uma pista dessa distorção?

Continuar lendo

Lúcio Jr. – Democracia popular x Democracia como valor universal ou: como Carlos Nelson Coutinho arruinou a esquerda brasileira

Escrevo esse artigo mais como militante do que como artigo científico. É mais um artigo de combate, dirigido contra a enorme moda do marxismo gramsciano no Brasil, uma verdadeira “Gramsci-mania”.

Os conceitos de Gramsci hoje são a forma por excelência com que o revisionismo anula o marxismo-leninismo no Brasil e precisam urgentemente ser combatidos e contestados. O conceito de bloco histórico desmantela a idéia do Partido de Vanguarda, a criação de uma hegemonia fornece argumentos para a falácia da revolução socialista pela via parlamentar, a divisão entre marxismo ocidental e oriental, já exposta pelo esquerdista Pannekoek nos anos 20, serve para melhor desvalorizar a experiência russa como modelo, descartando Lênin, que só seria útil para a Rússia e suas particularidades. Na prática, esquerdistas como Pannekoek, ao deixar de lado o norte que é a teoria de Lênin, oscilam entre a revolução de qualquer jeito agora e o derrotismo profundo, quando não, passam para o lado da reação, em geral a troco de remuneração.

Quando lançou Democracia como Valor Universal, Carlos Nelson Coutinho, na realidade estava conclamando a esquerda brasileira para deixar de lado a perspectiva revolucionária e aderir ao reformismo, a ocupar cargos na “porosa” máquina estatal, nas universidades, ONGs, prefeituras, no que foi extremamente bem sucedido. Mas, Coutinho precisava ir ao baile da esquerda vender seu peixe empesteado com um disfarce elegante e democrático, acima de qualquer suspeita. Ele vai achar o disfarce perfeito no Gramsci dos anos 30, quando Gramsci produziu suas teorias aparentemente de acordo com a frente popular e a aliança de todos contra o fascismo, o Gramsci que vivia encarcerado e foi fiel ao partido comunista até o fim. A duplicidade política de Gramsci lhe cai como uma luva. É justamente dessas posições ambivalentes que ele precisa. Para poder abandonar Lênin com alguma credibilidade, Coutinho não recorre ao costumeiro e sórdido Trotsky. Trazer à baila textos de Trotsky é trazer ao centro da cena o pensamento de Stálin, uma vez que derrotar Stálin é a sua grande obsessão, perseguida com uma nota histérica, em boa parte dos textos de Trotsky. A prática esquerdista dos trotskistas obviamente é mais um elemento para que Coutinho decida se afastar deles. Gramsci vai lhe dar uma máscara extremamente respeitável.

Continuar lendo

Recortes de “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado” e “O Estado e a Revolução”

A Origem da Família, da Propriedade Privada, e do Estado
F. Engels
Março – Maio 1884

O Estado não é, de forma alguma, uma força imposta, do exterior, à sociedade. Não é, tampouco, “a realidade da Ideia moral”, “a imagem e a realidade da Razão como pretende Hegel. É um produto da sociedade numa certa fase do seu desenvolvimento. É a confissão de que essa sociedade se embaraçou numa insolúvel contradição interna, se dividiu em antagonismos inconciliáveis de que não pode desvencilhar-se. Mas, para que essas classes antagônicas, com interesses econômicos contrários, não se entre devorassem e não devorassem a sociedade numa luta estéril, sentiu-se a necessidade de uma força que se colocasse aparentemente acima da sociedade, com o fim de atenuar o conflito nos limites da “ordem”. Essa força, que sai da sociedade, ficando, porém, por cima dela e dela se afastando cada vez mais, é o Estado.

(…)

O segundo traço característico do Estado é a instituição de um poder público que já não corresponde diretamente à população e se organiza também como força armada. Esse poder público separado é indispensável, porque a organização espontânea da população em armas se tornou impossível desde que a sociedade se dividiu em classes … Esse poder público existe em todos os Estados. Compreende não só homens armados, como também elementos materiais, prisões e instituições coercivas de toda espécie, que a sociedade patriarcal (clã) não conheceu.

(…)

Continuar lendo

André Ortega – Coreia: Ditadura x Democracia

Por André Ortega – criador do blog Realismo Político (Realpolitik) e também editor deste blog (Iglu Subversivo)

Coreia: Ditadura x Democracia


Tendo viajado para a República Popular Democrática da Coreia, a Coreia do Norte(abril/2011), as pessoas sempre fazem perguntas sobre este peculiar país que visitei e sempre estudei(e estudo) muito material a respeito. Decidi escrever alguns textos com base nas perguntas mais frequentes e nesse caso vou abordar os problemas relacionados a política, ao Estado norte-coreano, usando de algumas discussões que tenho registradas e abordando tudo de uma forma mais geral. Vale observar que no texto falo mais nos tons do positivismo, não do marxismo.

“O que você acha do regime norte-coreano? E do regime da Coreia do Sul? Você apoia a ditadura?”

Continuar lendo